Com uma seleção poética profunda, “Exátomos” mergulha na exatidão dos átomos, incitando reflexões sobre a vida e o mundo
“a terra não é plana
mas é chata”
A seleta de poemas de “Exátomos”(Ed. do Autor, 2023/ 135 páginas), traz a exatidão dos átomos em tudo que existe e abre reflexões sobre o que fizemos com a vida. Um livro de poemas (dividido em cinco partes: Exátomos, Sêmen, Eterna Cadência, Desastros e Porra) e que surge com uma capa que ainda faz pensar no interminável verso que nunca ficará pronto.
“leia depois de fumar
qualquer coisa que não seja tabaco
depois de uma taça de vinho, ou duas
de um passeio de barco no rio tapajós
depois de ligar lhasa de sela
e sentir ativar os átomos
enquanto desembrulha as páginas
leia depois de rememorar
um amor fragmentado
pelo uso, pelos anos:
novinho em folha
leia em voz alta, colocando acordes
de acordo com a alma, naquela noite
violão a postos e um refrão de rock
leia depois de pegar a estrada
e fazer xixi num posto sujo no sul de minas
de sentir o sol reacendendo a vida
ou a chuva escorrendo os poros
leia depois do orgasmo, ou antes do precipício
ao atravessar a mesma velha avenida
e, pelos multiversos, despedaçar os muros”
poema de Clara Baccarin após leitura do livro
Sobre o Autor:
Vitor Miranda estreia na literatura com o livro de contos “Num mar de solidão”. um dos contos, “Pise fundo meu irmão”, virou curta-metragem e Vitor recebeu um prêmio de melhor ator.
Em 2016 aparece com sua primeira publicação independente, “Poemas de amor deixados na portaria”, livro que deu origem a Banda da Portaria. Como letrista tem parcerias com artistas como Alice Ruiz, Rubi, Luz Marina, Vange Miliet, Dani Vie, João Mantovani, João Sobral, Touché, Zeca Alencar e Heron Coelho.
Em sua aproximação com figuras da poesia curitibana, lança pela Editora Kotter o livro “A gente não quer voltar pra casa”.
Experimenta na linguagem em 2019 com o romance poema “A moça caminha alada sobre as pedras de Paraty”.
Inicia o projeto de entrevistas “Prosa com Poeta” no qual entrevistas figuras como Alice Ruiz, Maria Vilani, Bobby Baq, Dionísio Neto, entre outros artistas. Organiza o Movimento Neomarginal onde exerce o ofício de agitador cultural. Volta aos contos com “O que a gente não faz para vender um livro?” pelo Selo Neomarginal onde destila todo seu sarcasmo.
Em 2023 surge com “Exátomos” novamente pelo Selo Neomarginal.
Por Bárbara Will – leitora e psicóloga (Prefácio)
“conhecemos o vitor miranda blasé e sarcástico em seu livro “O que a gente não faz para vender um livro?”
para mim, vitor é mais do que isso. não é somente ironia e descrença, não é só niilismo. não é apenas essa faceta que o compõe, embora essa também esteja lá.
esse livro, Exátomos, não é como o de contos. a provocação aqui é outra. é mais profunda, menos óbvia, menos escancarada.
como em “a moça caminha alada sobre as pedras de paraty”, aqui não tem nada dado. o leitor tem que sentir a provocação e a profundidade que tem cada poema.
Exátomos é lindo como a exatidão que completa as coisas. são poemas que fez em diferentes contextos e momentos nos últimos anos.
vejo crítica, amor, humanidade, esperança, desesperança, crença e descrença.
“a Terra não é plana
mas é chata”
versos de abertura que escolheu. são boas frases que surgem como uma apresentação que não traduz a totalidade de sua obra. a faceta da ironia, da sagacidade, já ficou clara em seus contos.
um leitor desatento pode ficar embriagado com seu humor ácido e achar que reside na aparente descrença com a humanidade seu conteúdo. em mim, é exatamente o contraponto que fascina. o que é genial e lindo. seu deboche, sua ira até quando escreve, demonstra justamente a mágoa pelo que o mundo poderia ser.
apesar de sempre se vestir do personagem que acha o mundo uma cretinice, vitor se comove é com a beleza escondida atrás do cruel. poeta que está atento de tal forma que é difícil suportar.
nos faz pensar e repensar a vida. me faz crescer como ser humano e é exatamente isso que busco na literatura.
vitor cumpre o papel de seu ofício. Exátomos cumpre seu papel como obra. leremos a principal característica de vitor como escritor: a versatilidade. há todos os sentimentos nesses poemas.
através da poesia vitor cospe as mazelas do mundo. mas também se nutre na poesia. floresce. escreve sobre a morte encefálica do mundo ao mesmo tempo que erotiza a polis com margaridas e cactos.
leio vitor assim e todas as definições parecem pouco ao desvendar a alma do poeta”
Por Marília Calderón – multiartista e psicanalista
Enquanto começam as guerras entre átomos, espécies, estrelas, Vitor insiste em fazer fronteiras estando – não exatamente – no meio de um poema. É nas margens artísticas, entre palavras, livros, manifestos de rua, canções, fotos, vídeos e movimentos coletivos, que Vitor escreve seu não lugar de poeta. É preciso vagar em vão pelas esquinas para habitar o tempo em que o tempo não conta, em que todo cálculo da matéria é só pretexto para inusitados encontros. Entre não ditos, interditos, conflitos e sonhos que, por mais distantes que estejam, habitam cada uma de nossas células. Gosto de poetas que vivem na própria pele a arte que fazem, e é o caso deste que anda por aí provocando prosas, oferecendo versos, tecendo parcerias e amizades poéticas. Conheci este artista há muitos anos na casa barco, esquina entreporto de artistas. Logo notei seu hábito de criar, além de versos, movimentos de resistência e criação coletiva, viva, transeunte. Se poetas sonham com a imortalidade após a morte, mas a imortalidade se acaba com a morte do tempo, a poesia movimento segue sendo poderosa arma – d’água – contra a finitude de todas as horas exatas. As linhas de Vitor são um exemplo de como exátomos dançam quando chacoalham suas fronteiras, tornando-se por exemplo neologismos e versos. A poesia de Vitor não nos torna imortais, porém faz de nossos lutos e lutas atos mais vivos, diversos e fluidos.
Trechos de poesias de “Exátomos”
Exátomos
“os filósofos atomistas pensavam que o universo
era constituido por partículas indivisíveis
cada uma delas com suas formas particulares
e por isso hoje as crianças montam em seus quartos
universos com peças de lego e deixam nas salas
os resquícios de uma guerra voltando para suas Ítacas
inventando mil metáforas para não arrumar a bagunça
acabam por convencer seus pais que estão muito
ocupados em suas vidas adultas para entender poesia
e terminam por recolher os átomos do chão da sala
os filósofos atomistas pensavam que o átomo era eterno gerações posteriores nomearem planetas e satélites
com nomes gregos e um dia um menino negro do bronx olhou para o céu e disse que Plutão não era o nono planeta outras crianças americanas enviaram mensagens raivosas uma delas invade uma escola e prova que o ódio é eterno”
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